O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, nesta quinta-feira (27), a audiência de conciliação sobre a Lei do Marco Temporal, tese jurídica que concede o direito de demarcação apenas para as terras ocupadas pelos indígenas desde 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.
Na abertura da sessão, a equipe do ministro Gilmar Mendes informou que o tema da mineração em terras indígenas será retirado dos debates da cúpula que busca analisar e determinar a validade da tese jurídica que limita os direitos territoriais indígenas. Segundo o juiz Diego Veras, auxiliar do ministro, uma nova comissão será composta especificamente para debater o tema.
Mendes já havia publicado, na última reunião da cúpula, em 17 de fevereiro, uma minuta de proposta de alteração do Marco Temporal, que pode abrir margem para facilitar a exploração de recursos em territórios indígenas.
A proposta do ministro ressalta que as atividades de extração só seriam possíveis em ocasiões de interesse público da União. O documento ainda define como interesse público as “atividades de segurança nacional e proteção sanitária, obras de infraestrutura destinadas aos serviços públicos de transporte, sistema viário, saneamento, energia, telecomunicações, radiodifusão e à exploração de recursos minerais estratégicos, além de atividades e obras de defesa civil”.
Gilmar Mendes ainda propõe “regimes compensatórios” para os posseiros de terras indígenas que forem obrigados a desocupar os territórios, observando o tempo de ocupação em relação à promulgação da Constituição de 1988.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), uma das principais entidades defensoras dos direitos indígenas, retirou-se da mesa de negociações em agosto de 2023. À época, a entidade declarou que não havia igualdade nas discussões da câmara.
Indígenas protestam contra câmara de conciliação do STF
Em carta aberta aos ministros do STF, lideranças da etnia Xokleng denunciam a falta de legitimidade da câmara de conciliação. Os indígenas também solicitam que a Suprema Corte julgue a inconstitucionalidade da Lei do Marco Temporal (lei 14.701/2023).
“Qualquer acordo que venha da referida mesa de negociação não tem nenhuma legitimidade, pois nós, Povos Indígenas, não fizemos parte dela. E também não aceitamos nenhum tipo de negociação que restrinja o nosso direito ao território”, diz trecho do documento.
Durante o Debate Geral da 58ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), nesta quinta-feira (27), secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) Luís Ventura defendeu que o Marco Temporal representa um risco de extermínio aos povos indígenas isolados no Brasil.
“Está sendo utilizada a tese do Marco Temporal, já considerada por três relatorias especiais da ONU (Mudanças Climáticas, Tóxicos e Direitos Humanos, Direito Humano a um Meio Ambiente Limpo) como um grande retrocesso, contra os seus (povos em isolamento) direitos territoriais”, defendeu Ventura.
Os povos indígenas Tupinambá de Olivença, Tupinambá de Belmonte e Pataxó de Barra Velha, no extremo sul da Bahia, também se manifestaram sobre o retorno do debate do tema no STF. A Terra Indígena Pataxó de Barra Velha, recentemente, foi palco de violentos ataques de fazendeiros e operações truculentas da polícia baiana.
Em nota, lideranças de ambas as etnias anunciaram uma manifestação, que reivindica também o retorno dos processos demarcatórios de terras indígenas da região. A demarcação dos territórios está paralisada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) até que se finalize a câmara de conciliação.
“A violência contra nossos parentes tem sido brutal. Estão tentando criminalizar nossa luta pela terra, enquanto o governo federal se omite. Não aceitaremos esse retrocesso”, denunciou um dos líderes.