A organização da sociedade civil Redes da Maré publicou uma edição especial do Boletim Direito à Segurança Pública na Maré, levantamento que apresenta dados e relatos referentes a operações policiais nas 15 favelas do Complexo da Maré, na capital fluminense.
Intitulada “De Olho na ADPF 635”, a pesquisa é lançada no contexto do julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, conhecida como “ADPF das Favelas”, analisada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O processo visa reduzir o uso excessivo da força em operações policiais deflagradas nas periferias, com foco na atuação das forças de segurança do estado do Rio de Janeiro. O julgamento no Supremo está previsto para retornar na próxima quarta-feira (26).
Segundo o boletim, 42 operações policiais foram deflagradas na Maré durante 2024, número seis vezes maior que o registrado em 2021.
Com um total de 20 mortes em 2024, a letalidade das ações também registrou o maior índice desde 2022, quando foram contabilizados 26 óbitos. Apenas quatro mortes tiveram o local do crime periciado. Segundo a pesquisa, houve indícios de execução em outros 17 casos.
O levantamento destaca que, nos últimos oito anos, apenas 16 das 1.489 mortes em decorrência de operações policiais da Maré foram periciadas, e só um caso foi levado à Justiça.
Cerca de 93 residências foram invadidas por policiais sem mandato judicial durante as ações. Somente no dia 3 de setembro foram registradas 29 casas invadidas, acompanhadas de denúncias de ameaças, agressões físicas e até tortura.
Entre 2016 e 2024, cerca de 67% das vítimas de invasão foram mulheres cis e trans, enquanto 72% eram pessoas negras.
As operações policiais em proximidades de escolas somaram 88% dos registros, resultando em 37 dias de suspensão de aulas e mais de 7 mil estudantes afetados. Cerca de 90% das ações também foram deflagradas próximas a unidades de saúde, impactando 8.715 atendimentos em 2024.
Para a Rede das Marés, o levantamento ressalta a necessidade de uma política de segurança pública eficaz para moradores de favelas e periferias.
“O direito à segurança pública é algo que deve ser almejado individual e coletivamente, mas ainda é um direito completamente interditado para as populações empobrecidas. A polícia não consegue atuar nas diferentes regiões da cidade a partir de parâmetros legais e igualitários. O que esta medida [ADPF] pede é que haja respeito à Constituição nesses espaços”, defende a diretora da Redes da Maré e pesquisadora em Segurança Pública, Eliana Sousa Silva.